segunda-feira, 3 de maio de 2010

De que falamos quando falamos em Ambiente? (3.ª tarefa)


Ambiente o que é? Há um direito ao ambiente? Há um direito fundamental ao ambiente? Várias questões se colocam e várias respostas são possíveis, é caso para dizer: "a doutrina diverge"!

O que sabemos sobre o ambiente? Leigos dizem que "o ambiente pertence a todos". Será que o podemos entender como um bem jurídico? Será um bem por si mesmo ou um bem para o Homem?




  • Se entendermos o ambiente como um bem para o ser humano trataremos os bens naturais como veículos para satisfação das necessidades do Homem, o seu valor será aquele que o Homem para as suas necessidades dele conseguir extrair.


  • Se o considerarmos um bem em si mesmo então será visto como uma realidade só por si merecedora de tutela sem se ter em consideração a sua capacidade de satisfazer as exigências humanas. Aliás, o Homem na satisfação das suas necessidades terá de ter em consideração essa dignidade do bem ambiente.


De acordo com o que foi dito anteriormente é possível concluir que existem duas concepções de ambiente. Por um lado, ambiente será constituído por todos os recursos naturais e pelas actuações humanas que têm como ponto de partida a Natureza (acepção ampla). Por outro lado, numa concepção restrita de ambiente apenas será o conjunto de recursos naturais, ou seja, o ambiente merece uma tutela autónoma independente da consideração de algum dano na esfera do Homem. Por último ainda existe uma concepção que defende que o ambiente é um conceito indeterminado que será aferido de acordo com determinados dados de certa época.

  • Qual a concepção adoptada no ordenamento jurídico português?


No art. 5º/2 al. a) da Lei de Bases do Ambiente (LBA) o legislador procurou definir ambiente reconduzindo o conceito a uma concepção ampla.

Os arts 2.º/2, 4.º al. d), e), f), m) e n) e 5.º/2 al.f) do referido diploma assentam na protecção da Natureza enquanto bem em si mesmo.

O art.66º Constituição da República Portuguesa, doravante CRP, alia o ambiente à qualidade de vida, aderindo claramente a uma concepção antropocêntrica. O n.º1 deste preceito constitucional mede a tutela do ambiente face às necessidades do Homem. Porém, este número também restringe o conceito ao exigir um certo equilíbrio ecológico. E, no n.º 2, aproxima-se de uma visão ecocêntrica. A al. d) do n.º 2 do referido preceito faz referência ao princípio da solidariedade intergeracional, realçando assim que existe uma continuidade na utilização dos recursos naturais e por isso é necessário salvaguardar a sua capacidade de renovação. Seria então uma terceira solução - o ambiente não se protege a si mesmo mas também não é um mero instrumento ao serviço do bem- estar do Homem (antropocentrismo alargado). Assim, o Homem é parte integrante do ambiente e deve promover o equilíbrio ecológico.



  • O que penso sobre o ambiente?


Claro que o ambiente é um bem que pode ser aproveitado pelo Homem na satisfação das suas necessidades, ou seja é um bem susceptível de aproveitamento pelas pessoas, mas é necessário que esse aproveitamento seja racional, tendo em conta a capacidade de regeneração do próprio ambiente. Aliás, um dos objectivos do Estado é a protecção do ambiente como é visível em alguns preceitos da Lei fundamental, nomeadamente nos arts. 9.º al. e), 81.º al. m), 90.º e 93.º/1/d. Ainda existe um dever geral presente no art. 66º/1 CRP que recai sobre entidades públicas e privadas, cidadãos e Estado.

Ao analisar o art.66.º/1 1.ªparte evidencia-se uma dimensão subjectiva do ambiente. Essa dimensão é dificilmente compatível com a ideia de fruição geral do bem ambiente. Poderá chamar-se à colação a querela de saber se existe ou não um direito subjectivo ao ambiente.


Essencialmente, deve referir-se duas posições doutrinárias:



  • Professora Carla Amado Gomes - como o ambiente é uma realidade difusa, não tem subjacente a lógica de aproveitamento individual de um bem que subjaz à definição de direito subjectivo, a posição do individuo não se traduz no aproveitamento individual do bem mas apenas na utilização desse bem que está aliada a um dever fundamental de utilidade racional. Assim, de acordo com esta opinião, o direito fundamental consagrado na Constituição tem duas dimensões: o Estado deverá proteger os bens ambientais de modo a prevenir e sancionar comportamnetos lesivos; o Estado deverá desenvolver acções de preservação e de promoção dos bens ambientais. E ainda o indivíduo poderá usar o bem mas também tem o dever de o preservar. É exactamente esse poder/dever que segundo a Professora traduz a ideia de que a fruição não é individual mas genérica, por isso o cidadão tem um dever/direito de participação. Ambiente - bem público, imaterial e inapropriável




  • Professor Vasco Pereira da Silva - é um direito fundamental, é um direito subjectivo que reconhece as várias vertentes, não tem de existir uma fruição individualizada. Apesar da característica colectiva do ambiente a Constituição dá aos cidadãos uma posição subjectiva pública - garantia constitucional. Professor refuta o argumento de ser um bem inapropriável afirmando que há uma dimensão objectiva e subjectiva, não estando em causa a apropriação mas antes a possibilidade de aproveitamento do bem em termos individuais e essa possibilidade existe. Por sua vez, segundo o Professor a tripartição entre interesse legítimo, interesse difuso e direito subjectivo é uma falsa tripartição, pois apesar de serem possíveis diferentes técnicas legislativas o que interessará será dotar o cidadão de uma posição de vantagem juridicamente protegida. Sendo assim, o Professor adopta uma noção ampla de direito subjectivo, a qual existe sempre que exista uma protecção jurídica substantiva, o direito fundamental ao ambiente é um direito subjectivo público.


Concluindo, parece-me, e na esteira da opinião da Profesora, que o facto de o ambiente ser um bem genérico, que pertence a todos e não pertence a ninguém, é incompatível com a ideia de direito subjectivo (permissão normativa específica de aproveitamento de um bem), pois efectivamente não existe uma fruição individual de cada cidadão, aliás, a utilidade que o cidadão pode retirar desse bem pressupõe sempre também um dever de preservação e de ajuda ao Estado a preservar esse bem (direito de participação).

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