segunda-feira, 24 de maio de 2010

1.INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa a avaliação de um caso concreto, e bastante mediático, o do licenciamento e construção do novo estádio do Vitória Futebol Clube, o qual vai ter lugar no Vale da Rosa, em Setúbal, em plena Área Protegida. Este tema bule com uma boa parte da matéria leccionada na disciplina de Direito do ambiente, pelo que pareceu um assunto que pode constituir uma discussão com interesse no âmbito deste curso. Uma vez que parece bastante duvidosa a conformidade legal deste licenciamento, poder-se-á questionar o que pode não ter sido feito de acordo com as normas jurídicas aplicáveis, bem como da oportunidade do projecto em causa, sendo esse o propósito ao abordar esta temática.
Numa primeira parte do trabalho procurar-se-á um enquadramento geral das matérias envolvidas, de forma a elucidar o leitor sobre o que está em causa. Nesta primeira abordagem o propósito é analisar a Rede Nacional de Áreas Protegidas, fazendo referência ás várias classificações legais dela constantes. De seguida, importa saber como funciona o licenciamento no seio de áreas abrangidas pelo diploma das Áreas Protegidas, articulando as duas figuras, de modo a tentar compreender em que condições tal licenciamento poder ser diferido. Conexas com estas matérias estão, naturalmente, as do Estudo de Impacte Ambiental (doravante EIA) e Avaliação de Impacte Ambiental (daqui em diante AIA). Saber quando devem ter lugar e em que condições funciona o respectivo procedimento é nuclear para a compreensão das duas matérias que darão início ao trabalho. Após estes primeiros três passos, cabe fazer uma pequena alusão ao papel das Organizações Não-Governamentais do Ambiente (doravante referidas como ONGAS), na protecção destas áreas. Encerrando esta primeira fase geral do estudo em causa, deverá ser feita referência à figura da Responsabilidade Civil, a qual pode ser um elemento chave para averiguar responsabilidades no caso concreto.
Num segundo patamar pretende-se fazer uma análise casuística, no fundo, avaliar este caso concreto que é a construção de um estádio numa área que a lei protege, tendo em conta todo o enquadramento geral efectuado, aplicando ao caso em apreço as normas que foram alvo da detalhada análise constante da primeira parte do trabalho. A este propósito cabe fazer apenas um pequeno parêntesis: após contactar a QUERCUS, no sentido de receber informações relativas a este caso, uma vez que esta ONGA participou de forma activa no procedimento que conduziu à aprovação do licenciamento do estádio, tentando impedir a sua construção, não foi demonstrado qualquer interesse da referida organização em ajudar na elaboração deste trabalho, sendo certo que, na posse dos dados concretos e oficiais deste procedimento, haveria muito mais objectividade e conhecimento no tratamento desta matéria, pelo que se pede a compreensão em face destas limitações, dado que o trabalho será apenas baseado (no que aos factos diz respeito) na informações passível de consulta no seio dos diversos órgãos e meios de comunicação social.
Espera-se poder concluir o trabalho com a satisfação de quem compreendeu o que se passou em todo o processo, na expectativa de ter introduzido uma opinião válida e coerente, informando o leitor acerca dos acontecimentos, devidamente enquadrados do ponto de vista jurídico.

2. A REDE NACIONAL DE ÁREAS PROTEGIDAS

O Decreto-Lei nº 19/1993 (doravante RNAP), com as alterações que lhe foram introduzidas sucessivamente pelo Decreto-Lei nº 213/1997 e pelo Decreto-Lei nº 221/2002, cria e regula a Rede Nacional de Áreas Protegidas. Logo no seu primeiro e terceiro artigos, este diploma refere que o seu fundamento passa pela conservação da Natureza, protecção dos espaços naturais e das paisagens, preservação das espécies de fauna e flora, manutenção dos equilíbrios ecológicos e protecção dos recursos naturais, no fundo a preservação do Ambiente. Aí se refere também que, com esse propósito de preservação dos espaços naturais, podem ser criadas áreas protegidas, do forma a assegurar um grau de protecção mais forte, pois se é verdade que qualquer área da natureza deve ser alvo de protecção, por força da consagração constitucional do Direito ao Ambiente e à qualidade de vida (desde logo nos arts. 9º, d) e e), e 66º), não será menos verdade dizer que é mais difícil haver intervenção humana se forem criados um estatuto e um regime especiais para certas áreas que, pelas suas especificidades ambientais, carecem de um maior grau de protecção. É mais difícil, nomeadamente, construir nessas áreas. O legislador parece mesmo ter querido assegurar um elevadíssimo grau de protecção a áreas com especial sensibilidade quando, no nº3 deste art. 1º, admite até que se possa considerar área protegida, um domínio privado do Estado. Mas este avanço (aparente) é logo travado de seguida por uma tripartição dos níveis de interesse a ser implementados, aquando da criação de uma área protegida. Assim sendo, dividem-se as áreas protegidas em áreas de interesse nacional, regional e local, sendo que as primeiras vão, naturalmente, ser alvo de um maior rigor na sua gestão, bem como na permissão para a intervenção humana, comparativamente às de interesse regional e local. Tal é, de resto, corroborado pelo art. 4º, quando nele se dispõe sobre a gestão destas "áreas de interesse": as nacionais são geridas pelo Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB), antigo Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza (SNPRCN) - Instituto Público, sob superintendência e tutela do Ministro do Ambiente, tendo sido criado especificamente para a protecção ambiental, o que significa ser um organismo cuja área de actuação é bastante especificada , pelo que faz sentido concluir que irá sempre procurar zelar pelos interesses ambientais, na gestão dos recursos naturais que estão a seu cargo; por outro lado, as áreas de interesse regional e local, têm a respectiva gestão a cargo das autarquias locais ou assembleias de municípios, os quais, como se sabe, têm, maioritariamente, a seu cargo atribuições de ordem política, o que pode fazer duvidar da sua idoneidade para tornar efectiva a protecção que a lei pretende assegurar às áreas protegidas. Pode-se até acrescentar que são muitos os interesses económicos em jogo, quando se trata de matérias como a construção civil, pelo que muitas vezes haverá uma tendência para se preterir o interesse ambiental em benefício do interesse económico, o que, indubitavelmente, pode ser bastante pernicioso para a preservação da Natureza. É igualmente relevante assinalar a crescente (não diria generalizada, mas pelo menos bastante acentuada) corrupção que se verifica no seio do Poder Local, com emergentes casos polémicos de alegadas ilegalidades que constantemente vêm a público, pelas mãos, principalmente, da comunicação social. Talvez se tenha que considerar esta medida adequada, sob o prisma de que, concentrando todas as áreas protegidas na "jurisdição" do ICNB, correr-se-ia o risco de ineficácia da sua actuação, por impossível a esta entidade um controle efectivo de todas essas áreas, para além do óbvio interesse em promover a actividade económica, o que poderia ser deveras dificultado se o ICNB assumisse um papel demasiado autoritário e alargado na gestão de tais áreas. É indiscutível que esta ponderação entre o Direito ao Ambiente e o Direito à livre iniciativa económica por parte dos privados (ambos constitucionalmente consagrados) tem de ser feita casuisticamente, porém sem descurar que, numa fatia considerável dos casos, os interesses dos autarcas (na sua relação com os investidores privados), sobrepõem-se ao interesse público de protecção ambiental. Mas com isto não se pretende atacar o poder local, santificando o poder administrativo, exercido pelos membros do Governo, nomeadamente do Ministro do Ambiente, que é, relembre-se, a autoridade máxima em matéria ambiental, e, portanto, condicionadora da actuação do ICNB.
Neste sentido, precisamente, cabe a referência à obrigatoriedade de plano de ordenamento, para as áreas de interesse nacional, que são o parque nacional, a reserva natural e o parque natural (art. 14º/1), o qual é aprovado por decreto regulamentar e, consequentemente, pelo Governo. A referência exclusiva às áreas de interesse nacional é propositada, como irá ser explicitado a propósito do tratamento do caso concreto, na segunda parte deste estudo. Estes planos podem prever a construção de infra-estruturas ou outras construções, caindo na discricionariedade do Ministro competente que, para além de ser o responsável para a aprovação deste plano, pode muito bem dar as instruções necessárias aos membros do ICNB responsáveis pela sua elaboração, aquando da mesma.
Quando for criada uma área protegida de interesse nacional, no decreto-regulamentar que o faz, tem, obrigatoriamente, que fixar, entre outras critérios, aquele que vai presidir à utilização dos solos (uso, ocupação e transformação), bem como a especificação de que tipo de actividades podem decorrer ou ser introduzidas (por exemplo, actividades comerciais), e ainda quais os critérios e as condições em que será possível (sendo possível, claro) a execução de obras ou empreendimentos, quer sejam públicos ou privados (tudo isto consta do nº6, do art. 13º). É, portanto, condição para estas actuações que estejam previamente previstas especificadas as condições em que poderão decorrer. Caso contrário, e por muito estranho que possa parecer, a lei somente pune com contra-ordenação a violação desta norma (art. 22º/1,a)). E diz-se somente pois bem que poderia ser mais elevada a sanção, entrando no âmbito do Direito Penal, de modo a accionar o seu carácter preventivo em relação a actuações que não sejam conformes com a lei. Crê-se que, deste modo, seria assegurada uma tutela mais efectiva de protecção dos bens jurídicos em causa, porquanto haveria mais receios de ser alvo de uma acção penal, do que de uma mera sanção financeira, a qual pode, em muitos dos casos, não ser impeditiva deste tipo de condutas contrárias à lei. O legislador deveria ter tido uma pretensão de protecção muito mais agressiva do que aquela que efectivamente consagrou, mas uma vez mais se chama à atenção dos interesses económicos em causa, levantando a questão de saber até que ponto eles não poderão estar por detrás do receio e da fragilidade revelados pelo legislador nacional.

3. O LICENCIAMENTO DE OBRAS PARTICULARES

O Decreto-Lei nº 445/1991, alterado pelo Decreto-Lei nº 250/1994, de 15 de Outubro (posteriormente designado abreviadamente por LOP), trata a matéria do licenciamento de obras particulares, não só dos seus aspectos mais substanciais (como sejam, por exemplo, as diferentes fases de licenciamento, ou das entidades ou órgãos competentes para a emissão dos mesmos), como também de aspectos procedimentais (regula todo o processo de licenciamento, consagrando as devidas adaptações consoante a área em que se pretende construir a obra que é objecto de licenciamento).
Um olhar atento ao preâmbulo do diploma permite observar quais os principais objectivos que lhe subjazem, dos quais se destacam os seguintes: descomplexização dos projectos de menor dimensão, limitação do número de entidades intervenientes no processo, revogação do diferimento tácito e diminuição dos prazos para a conclusão do processo de licenciamento em metade. Qualquer destes objectivos parece, de resto, bastante plausível, visto não haver necessidade, por exemplo, de se manter um processo com elevado grau de complexidade para modificar instalações de electricidade (este exemplo é um dos que se pretendeu ver dispensado de licenciamento). Assim, o art. 3º/1 refere quais as obras que não carecem de licenciamento, mesmo que muitos dos casos referidos nessa enumeração (taxativa, crê-se) sejam de obras de grande dimensão e impacte considerável, por excepção ao âmbito do art. 1º/1, o qual consagra uma formulação bastante genérica. Não fosse o alargado âmbito do art. 3º/1, e praticamente qualquer obra estaria sujeita a licenciamento. Compreende-se o propósito do legislador, após atenta análise ao 3º/1: obras de reparação ou restauro que não importem modificações estruturais (pequena dimensão e impacte do projecto - alínea a)), obras promovidas pela Administração Directa ou Indirecta do Estado ou por entidades concessionárias de de serviços públicos ou equiparados no âmbito do respectivo contrato de concessão (alíneas c), d) e e)), bem como obras promovidas pelas autarquias locais (ainda que, neste caso, tenha que haver uma prévia aprovação por parte da Câmara Municipal respectiva, o que acaba por se traduzir numa aproximação, ainda que parcial e diminuta, ao processo de licenciamento - alínea b) e nº2, do art. 3º). Se as referidas na alínea a) não suscitam quaisquer dúvidas quando enquadradas com o primeiro aspecto realçado constante do preâmbulo do diploma, já os restantes podem não se considerar tão óbvios, embora haja, de facto, motivos subjacentes razoáveis. Os projectos da Administração Directa (daqui para a frente abreviadamente designada por AD) têm origem naquela que será a fonte mais elevada na hierarquia para conceder licenças.
Admitindo que, nalguns casos (como são os casos dos arts. 48º, ss) a origem da licença, ou pelo menos da aprovação de licenciamento, não poderá ser de âmbito municipal ou intermunicipal, terá que se admitir a intervenção do Ministro respectivo, mesmo até pelo seu papel em sede de ordenamento do território (vejam-se, a este respeito
a Lei nº 58/2007 - PNPOT - e do Decreto-Lei nº 380/1999, alterado pelo Decreto-Lei nº 310/2003 - BPOTU). Mas também os casos de projectos com origem na Administração Indirecta (AI), por via da política de descentralização que se tem seguido nestas matérias, podem ser aceites com semelhante fundamento. Quanto aos casos das concessionárias, elas ganham o direito à dispensa de licenciamento, uma vez que os contratos que dão origem à obra que pretendem executar, tiveram a sua fonte num acordo entre essas mesmas empresas e o Estado, logo foram contratos fundados num interesse público (simplifica-se esta discussão, mesmo tendo em conta que, não poucas vezes, o interesse público que é alegado, é de índole bastante duvidosa).
Percorrido o âmbito dos processos de licenciamento, sabendo quais devem ou não ser objecto deste acto, cabe agora ver quem são as entidades nele intervenientes. Qualquer que seja a área em causa, a emissão da licença é um acto camarário (art. 2º). Mas há que fazer uma destrinça entre os dois tipos ou as duas fases distintas de licenciamento. Por um lado o licenciamento mais comummente mencionado, o licenciamento de aprovação do projecto e construção. É por via dele que a Câmara Municipal (doravante CM) se decide pela aprovação ou recusa do projecto de construção, bem com pela eventual e posterior autorização de construção do projecto. Por outro lado há também a segunda fase de licenciamento, a qual consiste, construída a obra, na permissão de utilização da mesma, por motivos atinentes às condições de segurança e utilização da obra, pois na sua construção podem ter surgido condicionantes que não permitam a sua devida utilização. Mas o número de entidades intervenientes neste processo não se fica pelo âmbito local. Desde logo é exigida a intervenção da AD para a construção de obras referidas no art. 1º/1, nomeadamente de recintos de espectáculos públicos, quando sujeitos nos termos de legislação especial (art. 48º). Esta regra sofre uma supressão no artigo seguinte, sendo dispensada a intervenção ministerial quando haja plano de pormenor (PP), plano de urbanização (PU) ou alvará de loteamento (AL). Para além da AD, e noutro nível completamente diferente, podem intervir, do lado e a pedido do requerente, entidades de reconhecida idoneidade técnica (conceito indeterminado), de forma a fazer acompanhar o projecto de um certificado de conformidade, o qual visa acelerar o procedimento de licenciamento, no sentido em que garante o cumprimento de todas as disposições legais e regulamentares aplicáveis (art. 5º/3). Neste âmbito, poderão ainda intervir outras entidades com atribuições específicas, aquando da presença das figuras da Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) e do Estudo de Impacte Ambiental (EIA), os quais serão alvo da atenção deste trabalho, no próximo ponto a abordar. Para lá remetemos em tudo quanto diga respeito.
Cabe agora, de forma a concatenar o que já foi dito, proceder a uma articulação dos regimes da RNAP e do LOP, nomeadamente tentando compreender em que condições é possível construir obras de considerável dimensão e impacto, dentro de uma área protegida. Consideremos somente as áreas protegidas com interesse nacional. Como foi dito anteriormente, para que seja criada uma área de interesse nacional, é necessário um decreto regulamentar, o qual pode contar as condições de utilização do solo, bem como, entre muitas outras especificações, os tipos de construção que poderão ser feitos no futuro (art. 13º/6, LOP). Mas, tendo em conta a forma como este preceito se encontra redigido, estas especificações são meramente facultativas, o que leva à conclusão de que, quando não existam, devam constar do plano de ordenamento, o qual é obrigatório, nos termos do art. 14º/1, LOP, até pelo disposto no nº2, nos termos do qual este plano de ordenamento, também ele aprovado por via de decreto regulamentar, revoga o acto legislativo criador da área de interesse nacional. Mas pode, a este propósito, suscitar-se a questão de saber quais as consequências, ao nível do licenciamento de obras, da ausência de especificações quanto às infra-estruturas previstas no ordenamento da área protegida. Mesmo tendo em conta que cabe à comissão directiva da área em causa (um dos seus dois órgãos de gestão, a par do conselho consultivo) preparar e executar os planos e programas de gestão e investimento, após submissão à apreciação do conselho consultivo (art. 18º/3, a), RNAP), não parece que o licenciamento venha a ser decidido por este órgão, o qual não possui qualquer competência urbanística, nos termos gerais, ainda para mais se tivermos em atenção que, de acordo com o LOP, todo o licenciamento de obras privadas passa pelo poder local, excepção feita àquelas obras que tenham já passado pelas mãos do Governo. Então como entender o sentido destas atribuições à comissão directiva? Na minha modesta opinião, elas não serão mais do que medidas de protecção ambiental, entendendo-se planos e programas como instrumentos de planificação das áreas protegidas, no sentido de preservar e desenvolver as condições de subsistência da área em causa. Estas atribuições seriam de carácter meramente interno, pelo que a sua eficácia, muito embora pudesse ter também como destinatários os particulares que pretendessem usufruir, das mais diversas formas, do espaço natural protegido, não seria susceptível de ser imposta a quaisquer órgão dotados de ius imperii, como sejam os casos das CM's ou do governo. Esta conclusão poderá mesmo ser retirada do facto de o órgão máximo, aquele que institui o regime de área protegida e elabora o plano de ordenamento da área protegida, ser o Ministro da pasta respectiva, neste caso o Ministro do Ambiente.
Assim sendo, colocar-se-iam vários cenários possíveis, somente susceptíveis de uma resposta cabal em função do caso concreto e, principalmente, do conteúdo do plano de ordenamento da área protegida de interesse nacional. Por um lado, se o plano de ordenamento, original ou após alterações, contivesse já a previsão de um de três cenários possíveis, seguir-se-ia, nos termos gerais do LOP, o procedimento tendente a aprovar ou rejeitar o licenciamento, com a CM competente a ser o órgão com máxima autoridade nesta sede (art. 1º/1, LOP). Estas três possibilidades seriam as seguintes: 1- que a área protegida estivesse abrangida ou contivesse no seu plano de ordenamento um plano de pormenor ou um alvará de loteamento (arts. 10º a 30º, LOP); 2- que a área protegida tivesse abrangida ou contivesse no plano de ordenamento um PU (arts. 31º a 36º, LOP); 3- que a área protegida se encontrasse abrangida por um plano director municipal (PDM), arts. 37º a 41º, LOP. Contudo, na sua condição de plano especial de ordenamento do território (art. 9º/4, da Lei de Bases de Ordenamento do Território e de Urbanismo - LBOTP), estes planos são instrumentos especiais de ordenamento, pelo que não se podem confundir com as figuras acima assinaladas, sendo, de resto, directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e particulares (art. 11º/2, LBOTU). Daqui resulta que não se poderiam aplicar as regras gerais acima enunciadas. Restariam assim dois cenários distintos, que na verdade constituem um só: se a área, não estando abrangida por PP, AL, PU ou PDM, não estivesse também abrangida por plano municipal de ordenamento do território ou alvará de loteamento, ou se o projecto dependeria de aprovação da AD. E seria caso de uma só possibilidade porque, sendo o Ministro do Ambiente o órgão máximo responsável pela elaboração do plano de ordenamento da área protegida, e este não contivesse qualquer referência a nenhuma das possibilidades supra referidas, tal significaria que, das duas uma, ou não havia qualquer intenção do Ministro em permitir quaisquer construções dentro daquela área, ou, muito embora tal possibilidade não tivesse ficado expressamente prevista, ela é deixada em aberto, aquando da elaboração do plano. Portanto, seria uma situação reconduzível a uma obra cujo projecto carece de aprovação pela AD (arts. 48º a 50º, LOP). E caso o Ministro pretendesse aprovar a construção da obra, também são possíveis de equacionar dois cenários distintos: ou admitimos que o possa fazer por simples aprovação de um decreto regulamentar nesse sentido, ou exigimos que seja elaborada uma alteração ao plano de ordenamento da área protegida de interesse nacional, também sob a veste de um decreto regulamentar. Este é, aliás, um aspecto chave nesta discussão: não seria outra a forma possível de autorizar a construção, que não pela figura do decreto regulamentar, pois se é essa a forma prevista para a elaboração do plano de ordenamento, não poderá ser inferior aquela que pretende alterar esse mesmo plano (a este propósito o art. 14º/2, RNAP). Por fim cabe fazer referência a uma outra possibilidade em termos de conteúdo do plano de ordenamento de que tratamos. Como vem referido no art. 13º/1, b), RNAP, o plano de ordenamento deve conter as actividades condicionadas ou proibidas dentro da área protegida, pelo que, se nele se restringisse ou até proibisse quaisquer tipos de construção, ou somente determinados tipos, somente por decreto regulamentar do Ministro do Ambiente seria possível autorizar a construção pretendida pelo particular, exigindo-se aqui, a meu ver, um requisito extra legal: teria que haver uma fundamentação bastante específica e razoável por parte deste Ministro, referente aos motivos que o levavam a alterar a política de protecção da área em causa, uma vez que teriam que ser especialmente acautelados os interesses da população (dos particulares afectados com a construção e detentores de direitos legal e constitucionalmente protegidos), que viam substancialmente alterada a sua posição em relação àquela área. Caso contrário, poderia não estar a ser devidamente tutelada a protecção ambiental e a ratio que subjaz à elaboração de um diploma como este RNAP.

4. ESTUDO DE IMPACTE AMBIENTAL E AVALIAÇÃO DE IMPACTE AMBIENTAL (EIA e AIA)

A este propósito, as primeiras palavras servirão de enquadramento geral destas duas figuras, simultaneamente incidentes nas áreas transversais do Direito do Ambiente e do Direito do Urbanismo, antes de se seguir uma análise mais minuciosa do regime dos AIA e EIA a respeito dos planos, em particular dos planos especiais de ordenamento do território. O procedimento de AIA é, na verdade, um sub-procedimento, porque enxertado no procedimento principal de autorização, de projecto ou obra, de plano ou programa, nos dias de hoje já tido como um princípio em matéria de ambiente e urbanismo. Nos seus termos gerais, ele é regulado pelo Decreto-Lei nº 69/2000, de 3 de Maio (doravante vai-se-lhe fazer referência enquanto PAIA - procedimento de avaliação de impacte ambiental), enquanto resultado da transposição das Directivas 85/337/CEE e 97/11/CE, tendo esta última alterado a primeira. O procedimento de AIA abrange determinados projectos públicos e privados, susceptíveis de produzirem efeitos significativos no ambiente (art. 1º/1), sujeitando, obrigatoriamente ao procedimento em causa os constantes dos anexos I e II ao PAIA (art. 1º/3). A AIA contém, essencialmente,
três fases principais: a fase informativa (que abrange a descrição do projecto, alternativas, efeitos ambientais, resumo não-técnico, etc.), a fase consultiva (em que intervém as autoridades e o público) e a fase final (de elaboração do relatório, descrevendo os efeitos negativos e positivos do projecto, a nível ambiental). Enquanto expressão significativa do princípio da prevenção, a AIA procura combater não só o dano ambiental, mas, sobretudo, a própria ameaça de dano ambiental. Este princípio defende, numa definição algo primária, que será melhor prevenir e evitar a consumação de degradação ambiental do que remediá-la, após esta já se ter verificado (art. 66º/2, a), c) e d), CRP). Mas a AIA não se esgota enquanto expressão deste princípio, podendo ser reconduzida, pelo menos, a cinco outros, todos igualmente com consagração constitucional. A saber: o princípio do desenvolvimento sustentável, que se reconduz à necessidade de promoção de um desenvolvimento que procure satisfazer as necessidades da geração actual, sem comprometer a capacidade das gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades (arts. 66º/2, d) e 93º, d), CRP); o princípio da participação dos cidadãos, ou seja, o direito dos indivíduos e diferentes grupos sociais intervirem na formulação e na execução da política ambiental (art. 66º/2, CRP); o princípio da cooperação, na procura de soluções concertadas em matéria ambiental, no plano interno, entre o Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais (art. 81º, m), CRP); o princípio da integração, que se traduz na adopção de meios adequados para assegurar a integração dos objectivos ambientais nas políticas de desenvolvimento económico, social e cultural (art. 66º/2, f, CRP); e o princípio da informação, o qual assegura a publicidade crítica em relação a questões ambientais e pressuposto do exercício consciente do direito de participação dos cidadãos na definição e na execução da política do ambiente. Numa referência que poderia, em primeira análise, parecer bastante inovadora e ter o objectivo bastante vincado de protecção de áreas protegidas (perdoe-se a redundância), o diploma refere-se a "áreas sensíveis", no seu artigo dedicado aos conceitos (art. 2º, b), i)), incluindo neste "conceito" as áreas alvo de protecção pelo RNAP. Contudo, e mais uma vez, o legislador consagrou uma previsão oca, uma vez que, a lei não sujeita os projectos propostos para estas áreas a um maior grau de rigor, nas medidas a tomar em sede de AIA. Pode, então, perguntar-se qual a verdadeira razão de ser desta previsão. Da minha parte, e com toda a modéstia, não consigo descortinar quais terão sido. Para além deste absurdo legislativo, há outro que salta à vista de qualquer um, jurista ou não, que se predisponha a ler o diploma. Consagra-se a possibilidade de que exista um EIA, o qual deve acompanhar a entrega dos documentos necessários para o início do procedimento, mas cometem-se dois erros, a meu ver, crassos: primeiramente, este EIA é meramente facultativo, o que o torna praticamente desprovido de interesse, uma vez que a lei acaba por lhe retirar a importância que quis fazer crer que teria; em segundo lugar, o EIA encontra-se substancialmente limitado, por força de ser somente o proponente, ou seja, a pessoa individual ou colectiva, pública ou privada, que formula um pedido de autorização ou licenciamento de um projecto ou obra, quem pode usar essa possibilidade, quando teria sido preferível alargar essa prerrogativa à administração e às organizações ambientais, já para não falar dos particulares interessados, os quais poderiam socorrer-se deste meio para efectivar aquele que é, afinal, o princípio mais estreitamente conexo com a avaliação ambiental. Por fim, uma última crítica ao regime da AIA, por não se pretender tornar este trabalho numa pura critica legislativa, referente à incompreensível ausência de consulta pública na fase do projecto de execução quando ocorreu AIA na fase do estudo prévio ou ante-projecto, contrariando visivelmente a Directiva 97/11/CE, bastando pensar na possibilidade do projecto ter sofrido profundas alterações, para que fosse perfeitamente justificável a previsão de consulta pública na fase do projecto de execução. Parece que, independentemente das intenções comunitárias, o legislador nacional continuou a fazer as coisas "à sua maneira", numa obsessão tendente a sacrificar a defesa dos interesses ambientais, parecendo que, por ser um direito constitucional de terceira geração, o direito ao ambiente é mais facilmente sacrificável do que outros, com o do desenvolvimento económico à cabeça, numa clara violação do princípio, constitucional, nunca é de mais relembrar, da integração. Em tom de encerramento desta parte geral dedicada ao regime regra da AIA, cabe fazer referência a quatro aspectos de relevo. O primeiro é a constatação de que, na maior parte dos casos, a autoridade de AIA é o IPAMB (art. 7º/1, a)), sendo, de forma residual, as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR), a outra autoridade de AIA, nos casos que não caibam na competência do primeiro. O segundo aspecto a destacar é a existência de uma comissão de avaliação, nomeada pela autoridade de AIA, a qual vai elaborar e remeter à autoridade de AIA o parecer final do procedimento de AIA; por sua vez, a autoridade de AIA remete ao ministro responsável pela área do ambiente uma proposta de declaração de impacte ambiental (DIA); a DIA desfavorável, emitida pelo ministro, é vinculativa. O terceiro aspecto a referir é a previsão da pós-avaliação, a qual é realizada com base na monitorização do projecto, da responsabilidade do proponente, e em auditorias, cuja realização e âmbito são determinados pela autoridade de AIA (arts. 27º a 31º). A quarta referência reporta-se à Lei nº 19/2006, de 12 de Junho, a qual regula o acesso à informação sobre o ambiente, garantindo, em termos amplos e claramente positivos, o direito de acesso à informação sobre o ambiente, não sendo o requerente obrigado a justificar o seu interesse, embora com os limites referidos no art. 11º/6 deste diploma; quanto às ONGA, e como se verá no ponto seguinte, elas gozam de um papel bastante amplo, nos termos da LONGA.
Cabe agora uma análise ao regime específico, criado pelo legislador de 2007, em relação à AIA de planos e projectos. Regulado pelo Decreto-Lei nº 232/2007, de 15 de Junho, na sequência da directiva 2001/42/CE, este diploma teve como principal objectivo colmatar as insuficiências da AIA de projectos. Esta avaliação, ao contrário do carácter específico e direccionado da AIA geral, pode ser entendida como um processo integrado no procedimento de tomada de decisão relativamente a um plano ou programa, destinada a incorporar uma série de valores ambientais nessa tomada de decisão; será um processo contínuo e sistemático, que tem lugar a partir de um momento inicial do processo decisório público, de avaliação da qualidade ambiental de visões alternativas e perspectivas de desenvolvimento incorporadas num planeamento que vão servir de enquadramento a futuros projectos. Esta é uma caracterização que se retira (quase a papel químico) do preâmbulo do diploma. A sujeição (obrigatória) a AIA de planos ou programas (sempre tendo em conta somente o âmbito deste estudo) é a seguinte:

a) planos ou programas de ordenamento urbano e rural ou utilização dos solos (art. 3º/1, a));

b) planos e programas que, atendendo aos seus eventuais efeitos numa zona especial de conservação, devam ser sujeitos a uma avaliação de incidências ambientais, nos termos do art. 10º, do Decreto-Lei nº 140/1999, de 24 de Abril, na redacção do Decreto-Lei nº 49/2005, de 24 de Fevereiro (art. 3º/1, b)); de acordo com o art. 3º/5, estes são os planos e programas que contenham disposições relevantes para a subsequente tomada de decisões de aprovação, nomeadamente respeitantes à sua necessidade, dimensão, localização, natureza ou condições de operação;

c) planos ou programas que constituam enquadramento para a futura aprovação de projectos e que sejam qualificados como susceptíveis de ter efeitos significativos no ambiente (art. 3º/1, c)).

A responsabilidade de averiguação da sujeição de um determinado plano ou programa a avaliação ambiental cabe, como é natural, à entidade competente para elaborar o plano ou programa, o que, no caso dos planos especiais, nomeadamente no caso do plano (especial) de ordenamento de uma área protegida de interesse nacional, faz com que seja o ICNB a entidade competente para tal avaliação (art. 3º/2). São também essas entidades as responsáveis pela delimitação do âmbito da avaliação ambiental e sobre o alcance da informação a incluir no relatório ambiental (art. 5º/5). Já a qualificação como planos ou programas susceptíveis de ter efeitos significativos no ambiente (entenda-se, a decisão final), cabe, à semelhança do que sucede em matéria de definição do plano especial, aos membros do Governo responsáveis (art. 3º/6), cuja informação acessível ao público em geral deve ser colocada na respectiva página da Internet (nº7). Uma pequena referência para o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (doravante RJIGT), por força da sua ligação bastante estreita com o caso concreto dos planos especiais de ordenamento do território, uma vez que o seu art. 45º/2, b), prescreve que estes devem ser acompanhados de um relatório ambiental, o qual, como se verá de seguida, constitui o elemento central da avaliação ambiental de planos e programas, como sugere a opinião doutrinária maioritária.
Por forma a concluir este ponto quarto, proceder-se-á à enumeração e explicitação das várias etapas por que passa tal procedimento. A primeira etapa consiste na definição do âmbito da avaliação ambiental a realizar, bem como na determinação do alcance e do nível de pormenorização da informação a incluir no relatório ambiental (art. 5º/1, do DL nº 232/07 - futuramente referido como PAIAPP). A segunda etapa é constituída pela elaboração de um relatório ambiental - a tal fase central de que se falava há pouco -, o qual deve ter como conteúdo os principais objectivos do plano ou programa, as características ambientais das zonas susceptíveis de serem significativamente afectadas, os eventuais efeitos significativos no ambiente decorrentes da aplicação do plano ou programa, incluindo os efeitos secundários, cumulativos, sinergéticos, de curto, médio e longo prazos, permanentes e temporários, positivos e negativos, as medidas destinadas a prevenir, reduzir e, tanto quanto possível, eliminar quaisquer efeitos adversos significativos no ambiente resultantes da aplicação do plano ou programa, referindo somente aquelas que nos pareceram mais relevantes (art. 6º/1, PAIAPP). O terceiro passo é a realização de consultas às entidades com responsabilidades ambientais específicas e a da informação e participação do público (art. 7º, PAIAPP). A quarta etapa passa pela ponderação na versão final do plano ou programa a aprovar do relatório ambiental, dos resultados das consultas às entidades específicas e da participação do público (art. 9º, PAIAPP), decorrendo implicitamente do art. 10º, PAIAPP, uma obrigação de fundamentação em relação ao plano ou programa e ao modo como ele tomou em consideração os interesses ambientais em causa. Em quinto lugar, a elaboração de uma declaração ambiental, a cargo da entidade responsável pela elaboração do plano ou programa, a enviar ao IPAMB, e, nos casos em que seja obrigatório, a publicar em Diário da República (art. 10º/1, a), PAIAPP), a qual deve incluir os aspectos essenciais (muitos deles já constantes da fundamentação decorrente do plano ou programa) da decisão tomada. Por fim a sexta etapa, encerrando este complexo procedimento, passa pela avaliação e controlo dos efeitos significativos da execução de planos ou programas no ambiente, integrantes da designada monitorização (art. 11º, PAIAPP).

5. ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS DO AMBIENTE (ONGA)

O estatuto das ONGA é regulado pela Lei nº 35/1998, de 18 de Julho (doravante LONGA), o qual define que, para que possam usufruir desse estatuto, devem ser associações dotadas de personalidade jurídica sem fins lucrativos, que visem exclusivamente, ou seja, o seu objecto social, a defesa e valorização do ambiente e do património natural, bem como a conservação da Natureza (art. 2º/1), frisando somente os aspectos mais relevantes para o estudo em curso, de entre aqueles que são fixados neste diploma. O estatuto de ONGA por parte de uma associação depende do reconhecimento por parte do Instituto do Ambiente (IAMB), nos termos dos arts. 17º, ss (art. 3º). A uma ONGA pode ainda ser conferido o estatuto de utilidade pública, desde que se preencha o requisito temporal previsto no art. 4º/1, mediante parecer do IAMB, a emitir pelo Primeiro-Ministro (PM), de acordo com o nº2, do mesmo art. 4º.
Feito este enquadramento geral, importa perceber quais as funções de uma ONGA e de que modo se manifestam as suas atribuições, ainda no âmbito desta LONGA. De forma consentânea com o seu objecto social (de forma abrangente e muito genérica, a protecção do ambiente), as ONGA gozam de amplas atribuições por forma a efectivar esse propósito de existência, quer sejam ao nível do acesso à informação, quer também em termos de recurso à via judicial ou até na formação da política nacional e regional em matéria ambiental. Comecemos então pelas prerrogativas de acesso à informação, relevantes em matéria ambiental. De acordo com o nº1, do art. 5º, são quatro as diferentes áreas de actuação das ONGA, quando pretendam aceder a informações relativas ao ambiente: a) planos e projectos de política do ambiente; b) planos regionais, municipais e especiais (sendo estes últimos os mais relevantes para este trabalho) de ordenamento do território e instrumentos de planeamento urbanístico; c) criação de áreas protegidas; d) processos de AIA. Por forma a tornar mais eficaz este direito de acesso à informação, o nº3 consagra o poder de requerer a intimação judicial das autoridades públicas, para consulta de informação, bastante relevante para as situações em que uma ONGA pretenda aceder a informação e esta lhe seja negada pelas autoridades administrativas que tenham a seu cargo qualquer dos procedimentos previstos nas alíneas do nº1.
Uma vez consultada a informação relevante, pode uma ONGA promover junto das entidades competentes, por força da legitimidade que lhe é conferida, os meios administrativos de defesa do ambiente, bem como iniciar o processo administrativo e nele intervir (art. 9º/1). Apesar de a lei não fazer referência a esta ligação entre a consulta de informação e os meios judiciais de intervenção, e, valha a verdade, ela não é absolutamente indispensável, parece correcta a afirmação de que, uma vez consultada a informação em causa, uma ONGA fique munida de mais meios para fundamentar a sua intervenção junto das entidades administrativas competentes. Contudo, existindo indícios muito fortes de que estão a ser violadas regras ambientais, uma ONGA poderá naturalmente socorrer-se destes meios que lhe são conferidos pelo art. 9º/1. Porém, e em face do direito à consulta da informação, somente motivos atinentes à urgência de intervenção, parecem suficientemente razoáveis para que se permita a uma ONGA a intervenção referida, com preterição da respectiva fonte informativa, a menos que, por ter intervindo activamente e acompanhado o processo ao longo do seu decurso, uma ONGA tenha já reunido toda a informação relevante, que lhe permita concluir que a intervenção junto das entidades competentes seja a actuação mais ajustada em face dos dados concretos existentes. Esta legitimidade de que se fala, encontra-se concretizada no artigo seguinte, o qual deixa uma grande margem de manobra às ONGA, uma vez que não faz depender a sua legitimidade da existência de um interesse directo na demanda. Nas quatro alíneas deste art. 10º, fixam-se os meios de acção reconhecidos ás ONGA: a) propor acções judiciais para prevenir, corrigir, suspender ou cessar actos ou omissões das entidades públicas e privadas, que possam degradar o ambiente (veremos mais à frente que, no caso do novo estádio do Vitória Futebol Clube, a intervenção de uma ONGA - a QUERCUS - se fez por interposição de uma providência cautelar juntos dos tribunais administrativos, por forma a prevenir a degradação do meio ambiental visado com a construção da referida infra-estrutura); b) intentar judiciais para efectivação da responsabilidade civil relativas a acções ou omissões referidas na alínea a); c) recursos contenciosos para a protecção do ambiente; d) acções penais relativas ao ambiente.
Encerrando este ponto da intervenção em matéria ambiental das ONGA, uma rápida e sucinta referência ao direito de participação na definição da política e das grandes linhas de orientação legislativa em matéria ambiental, prevista no art. 6º. Esta norma é susceptível de algumas críticas, nomeadamente por nela apenas se prever a intervenção em matéria legislativa ambiental, ao nível nacional, como sugere a fórmula "grandes linhas de orientação legislativa em matéria ambiental", uma vez que, não obstante as ONGA terem sempre ao seu dispor os meios processuais e administrativos supra mencionados, poderia ser vantajoso, numa perspectiva de protecção do ambiente, que as ONGA pudessem também intervir no procedimento legislativo relativo a política regional e até local, uma vez que poderiam dar um contributo importante na defesa do ambiente em termos mais amplos, muito embora se saiba que as suas opiniões não sejam vinculativas e que, por isso, os responsáveis pela criação de legislação pudessem sempre decidir em consonância com as suas pretensões e, principalmente, com o interesse público.

6. RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO ECOLÓGICO E POR DANO AMBIENTAL

Até 2008, mais concretamente até ao dia 29 de Julho, o ordenamento jurídico português não autonomizava estas duas realidades, o que veio a suceder com o Decreto-Lei nº 147/2008 (doravante designado por RPRDE), dessa data, na sequência da Directiva 2004/35/CE. Este diploma aplica-se somente em sede de prevenção e reparação de dano ecológico, não abrangendo o dano ambiental. Nos termos do seu art. 11º/1, d), dano ecológico é toda a alteração adversa mensurável de um recurso natural ou a deterioração mensurável do serviço de um recurso natural que ocorram directa ou indirectamente. Conjugando este “conceito” de dano ambiental com o preâmbulo da Directiva, nomeadamente com a própria definição que aí se dá de dano ecológico (existe quando um bem jurídico ecológico é perturbado, ou quando um determinado estado-dever de um componente do ambiente é alterado negativamente), bem como com as preocupações relativas ao antigo sistema, que somente perspectivava o dano ao meio ambiental como um dano às pessoas e às coisas, já parece possível de avançar com um delimitação do âmbito distinto das duas figuras: por um lado o dano ambiental seria todo o dano ao meio ambiente considerado de uma perspectiva subjectiva (de dano às pessoas e/ou às coisas), por outro, dano ecológico seria todo aquele que fosse causado ao ambiente em si considerado, independentemente de afectar pessoas ou coisas (numa perspectiva objectiva de dano ao meio ambiental). De seguida analisar-se-á o dano ecológico, por ser aquele que, no âmbito do presente trabalho, assume mais relevância.
No esteio da Directiva 2004/35/CE, o RPRDE procura, mais até do que reparar o dano em si, prevenir que ele possa ocorrer. Este princípio da prevenção parece, aliás, e tendo em conta o que já ficou dito em sede de AIA, uma nota dominante na legislação ambiental portuguesa, na perspectiva de que é, de facto, a melhor forma de actuação ao dispor do legislador. O âmbito de aplicação do diploma (reportamo-nos, salvo referência em contrário, ao RPRDE) contempla a protecção das águas, do solo e das espécies e habitats protegidos, abrangendo, naturalmente, a RNAP, que já foram objecto de explicitação anteriormente. Pode também concluir-se da análise deste diploma que ficou consagrada uma noção ampla de responsabilidade, no sentido de que não é necessária a existência de um dano, mas tão somente a sua iminência, a qual não é estritamente temporal, mas também circunstancial, o que se retira dos art. 5º e 11º/1, b). As medidas de carácter preventivo obedecem aos termos do Anexo V (art. 14º/3), podendo, em situações extremas, com grande gravidade e risco, para pessoas e bens, a entidade competente prescindir, nesses casos, da emissão de determinados actos (art. 17º/2). Se a ocorrência de um dano ecológico se der em virtude de défice de ponderação de circunstâncias de risco com base na melhor informação disponível gera-se igualmente responsabilidade por facto ilícito, mas com a particularidade da Administração suportar de forma solidária com o operador. A responsabilidade a título objectivo só ocorre quando estejam em causas actividades inscritas no Anexo III, pois somente estas podem ser classificadas de tipicamente perigosas.
Antes de seguir parece importante proceder a uma pequena nota, que se prende com a relação entre o operador e a entidade licenciadora. De facto, os actos de licenciamento estabelecem uma relação para-contratual entre o operador (seja ele industrial, produtor, comerciante) e as entidades com competência autorizativa, pelo que se criam nesta relação, competências de fiscalização muito fortes, renováveis em função das alterações, tanto fácticas quanto legislativas, que venham a surgir. O relevo desta questão prende-se com os casos de responsabilidade facultativa, nos casos, por exemplo, de não ter havido culpa do operador e a actividade ter sido validamente autorizada pela entidade competente. Nestas situações criou-se um mecanismo de responsabilidade objectiva, por inexistência de culpa do operador, consagrado no art. 20º.
Passe-se agora à análise do art. 18º, estando em causa a legitimidade para a denúncia da ameaça eminente, em três situações distintas, sendo necessário em todas elas que esteja devidamente fundamentada: 1ª- caracterização de um dano patrimonial directo, actual e provável (alínea c)); 2ª- caracterização de um dano pessoal ou patrimonial colateral, actual ou provável (alíneas a)); 3ª- caracterização de um dano exclusivamente ecológico, denunciável por qualquer autor popular, nos termos da Lei nº 83/95 e do art. 53º/2, CPA. Uma nota apenas para o seguinte aspecto: a reparação de danos ecológicos promovida por autores populares não resulta na atribuição de quantias pecuniárias aos peticionantes, mantendo-se assim a vontade da Directiva em não atribuir indemnizações por dano moral da colectividade por perda de qualidade de bens ambientais.

7. O CASO CONCRETO DO NOVO ESTÁDIO DO VITÓRIA FUTEBOL CLUBE

Uma vez percorrido todo este caminho, chega-se agora ao momento em que se impõe avaliar o caso concreto que nos levou a iniciar este trabalho: a construção do novo estádio do Vitória Futebol Clube (daqui em diante abreviadamente designado por VFC), também desginado por novo estádio municipal de Setúbal. Como é sabido, a região que circunda o rio Sado, bem como toda a zona da Península de Setúbal é consideravelmente rica em paisagens naturais de grande importância no nosso país. A Serra da Arrábida é como que uma "Amazónia", umas das maiores e mais ricas zonas verdes portuguesas, com uma área de extensão consideravelmente grande, a qual vai desde a zona costeira de Setúbal até, por exemplo, perto de Sesimbra, servindo de forma mais ou menos directa uma percentagem de, pelo menos, 5% da população portuguesa, na medida em que é um "balão de oxigénio" para o crescente e preocupante fenómeno da poluição. A protecção assegurada a este local é de grande relevância, mas, ainda assim, é fácil de constatar que essa protecção é violada com alguma frequência e que nem sempre lhé é dada a devida força, pois no seu seio se situa, por exemplo, uma renomada cimenteira, bem como uma quantidade crescente de belas moradias, apenas acessíveis a sujeitos com contactos muito fortes na relação com o poder local. Mas se pensarmos que, para além da Serra da Arrábida, esta zona tem outras relíquias naturais e que também estas podem estar em risco de se manterem intactas e devidamente preservadas, é natural que ocorra um acréscimo de preocupação a este respeito. O Estuário do Sado é uma zona de grande relevo em termos de interesse botânico e faunístico, o que levouo legislador, em 1980, a classificá-la como uma área protegida de interesse nacional, nomeadamante na condição de Reserva Natural. Se a Serra da Arrábida já tem uma cimenteira, o Estuário do sado está prestes a acolher um estádio de futebol, o qual, como se sabe, vai implicar muitas outras infra-estruturas, certamente com um impacto considerável em termos ambientais. E se estas zonas próximas de setúbal (uma das cidades poruguesas com níveis mais elevados de poluição no âmbito nacional, não obstante esta quantidade grande de "zonas verdes") deveriam ser alvo de um cuidado muito grande, a verdade é que parece que são zonas preferênciais de construção e, consequantemente, ficam cada vez mais desprotegidas. É neste contexto que surge a nossa preocupação com os mais recentes acontecimentos, pelo que se considera fundamental vir em defesa de um direito consitutcional que parece ainda não ter a devida atenção: o Direito ao Ambiente.
Dentro das áreas protegidas, abrangidas pelo regime consagrado no RNAP, encontramos as Reservas Naturais, sítios de intersse nacional (o mais forte dos graus de classificação destas áreas, com a suposta consequência de um conservadorismo mais elevado, quando esteja em causa construção humana), definidas pelo art. 6º/1, RNAP, como áreas destinadas à protecção de habitats da flora e da fauna. A justificação deste tipo de classificação de uma zona, prende-se com a maior sensibilidade da mesma, carecendo de um grau de protecção correspondente a essa sensibilidade. A Reserva Natural Estuário do Sado (RNES) encontra-se naturalmente dentro do âmbito de aplicação deste diploma, pelo que são esses motivos de maior sensibilidade e necessidade de protecção especial, que levarão a tal classificação. A localidade do Vale da Rosa encontra-se geográficamente abrangida pela Reserva Natural Estuário do Sado, e nela vao ser construído o novo estádio do VFC. Como ficou dito no ponto 2 deste trabalho, uma Reserva Natural carece de um plano de ordenamento (PO), o qual deve conter várias especificações de modo a restingir a acção humana e prosseguir os objectivos de uma tal classificação. Olhando com atenção para o PO desta Reserva Natural, constata-se que o grau de promenorização é bastante reduzido, contendo demasiados conceitos indeterminados e dando assim uma maior margem de discricionaridade àqueles a quem compete autorizar as construções nessa área protegida. É verdade que o art. 13º/6, RNAP,
indica critérios que somente serão incluídos no PO se a entidade competente para o elaborar assim o entender (são portnato facultativos), mas pergunto-me se o legislador não deveria ter exigido que tais critérios de utilização das áreas protegidas não devessem assumir um carácter injuntivo, pois só assim se consiguiria garantir uma protecção condicente com os propósitos que o diploma visa ter. Assim, não se pode dizer que o PO da RNES viole este art. 13º, na medida em que, ainda assim, contem algumas especificações de utilização do solo, por exemplo. Mas não se encontram fixados critérios objectivos, o que não deixa de ser preocupante.
Assim sendo, os projectos de licenciamento de obras particulares (na perspectiva de aprovação do projecto e construção da obra) têm mais facilidade em passar junto das entidades competentes. Se for tido em conta o conteúdo do PO da RNES, nele não se parece incluir qualquer PO, PP, PU ou alvará de loteamento, nem qualquer referência à possibilidade de estar abrangido por PDM, pelo que da articulação do LOP com o RNAP somente pode resultar uma conlusão: esta é uma obra que está incluída no âmbito dos arts. 48º a 50º, LOP (sendo certo que está sujeita a licenciamento). Face à faltas dos tais critérios objectivos de que se falava ainda agora, não pode ser outra a conclusão em termos de condições de licenciamento, por forma a respeitar os objectivos fixados pelo RNAP, na sua articulação com o LOP. De forma coerente com o que foi dito no ponto 3, colocando o licenciamento de um estádio de futebol no seio uma Reserva Natural, não poderá ser outra a solução que não seja a de fazer passar a autorização do licenciamento pelos ministros competentes, para que, na eventualidade de esta ser concedida, a CM competente possa emitir o acto administrativo que vai no sentido de diferir ou indiferir o licenciamento de construção da obra. Ainda assim, na senda do que foi supra defendido, estes minstros, caso decidissem por autorizar o licenciamento, deveriam ser capazes de fundamentar devidamente a decisão (e esta fundamentação deveria ser muito extensa e coerente), não deixando qualquer margem de dúvidas acerca dos motivos que os teriam conduzido a tal decisão, bem como quais as medidas exigidas ao particular de forma a atenuar ao máximo as potenciais consequências nefastas para o meio ambiental, para aquele meio ambiental em particular, por ser alvo de uma protecção especial.
Mas pensar que este projecto se ficaria pela construção do estádio seria ignorar a realidade e assumir uma visão bastante inocente. Para que as pessoas se possam deslocar para o estádio estradas com qualidade terão que ser construídas; para que as pessoas possam estacionar as suas viaturas particulares, terão que ser construídos parqeus de estacionamento; para aqueles que queiram dirigir-se para o estádio sem utilizar viatura pessoal, terão que ser criados itenerários de meios de transporte públicos, que satisfaçam a procura; terão que exisitr estabelecimentos comerciais (cafés, lojas, etc) para entreter as pessoas nos períodos em que não existem atracções dentro do estádio. A isto se acrescenta que, num propósito de redistribuição e requalificação do município de Setúbal, se encontra previsto, a médio prazo, um plano para a construção de condomínios e habitações de luxo, com vista a atraír novos moradores. E aqui surge uma pergunta que faz todo o sentido para quem estaja a par destas matérias: não deverá todo este projecto estar sujeito a AIA? A resposta tem de ser positiva. De acordo com a regra geral constante do art. 1º/3, PAIA, as construções constantes dos Anexos I e II desse diploma estão sujeitas a AIA. Mas a construção do estádio não cabe nestes Anexos, pelo que terá de ser outro o caminho a seguir. Contemplando a definição de áeras sensíveis, e incluindo as áreas abrangidas pela RNAP nesse âmbito, poder-se-ia pensar que estava encontrado o caminho adequado a proteger a RNES, sujeitando este projecto a AIA. Mas a verdade é que esta definição é absolutamente inócua, visto que não existem quaisquer exigências especiais comparativamente a uma outra qualquer área. Então e o EIA? Poderia ser um mecanismo interessante de activar quando se pensasse na possibilidade de protecção de uma área protegida. Pois, mas o problema é que o legislador entendeu que estudar o projecto, avaliar o seu previsível impacto no meio ambiental só seria do interesse do proponente e não de qualquer cidadão interessado ou, pelo menos, de órgãos do poder local ou de ONGA's. Incrível! É certo que há mecanismos ao alcance da população em geral, mas teria sido preferível, num exercício de adequação aos princípios oriundos do Direito Comunitário (nomeadamente do princípio da prevenção), conferir a outra parte que não só o proponente alguma margem de manobra neste âmbito.
E se, na perspectiva do regime geral da AIA, não se descortina qualquer solução para sujeitar tal projecto a AIA, já em sede de AIA de planos e programas (PAIAPP) é possível concretizar esse objectivo. E se o regime do PAIAPP somente foi criado em 2007 com vista a suprir as deficiências do regime geral da AIA, o que poderia ser um óbice visto que somente se aplica a planos e projectos futuros e o PO da RNES é-lhe anterior, a verdade é que aqui o legislador nacional consgrou mecanismos com vista a não restringir em demasia o âmbito de aplicação do diploma. São as alíneas b) e c), do art. 3º/1, PAIAPP, que permitem a protecção adequada. Começando pela última, estão sujeitos a AIA os planos e projectos que constituam enquadramento para uma futura aprovação e que sejam qualificados como suscptíveis de ter efeitos significativos no ambiente, sendo que terá de partir dos ministros competentes tal qualificação (art. 3º/6, PAIAPP). Estas normas seriam susceptíveis de aplicação ao caso concreto, não fosse a previsão da alínea b). Nesta se dispõe que, quanto a efeitos numa zona especial de conservação (na qual se poderá enquadrar a RNES), estarão sujeitos a AIA os planos e programas que contenham disposições relevantes para a subsequente tomada de decisões de aprovação, nomeadamente respeitantes à sua necessidade, dimensão, localização, natureza ou condições de operação. Analisemos individualmente estes cinco aspectos que se devem ter em conta para efeitos de AIA. A necessidade de construir um estádio novo para o futebol profissional do VFC é imperiosa, visto que o antigo estádio do clube (o velhinho Estádio do Bonfim), para além das óbvias limitações que este tinha, mesmo em termos de segurança, a verdade é que o aspecto essencial é que esse estádio já não pertence ao VFC, visto que os terrenos onde o estádio se situa foram já vendidos (em face do elevadíssimo valor patrimonial dos mesmos), e portanto o prazo para libertar o espaço está já a aproximar-se. Este requisito, chamemos-le assim, está preenchido. Quanto à dimensão do mesmo, coloca-se o primeiro grande problema. Como ficou já dito, não está em causa somente a construção do estádio, mas também todas as restantes infra-estruturas, inerentes ao complexo desportivo em causa. E se, quanto a este aspecto, até se pode considerar como adequada a dimensão deste projecto, se tivermos em conta que a construção de um estádio exige as devidas infra-estruturas. Mas já se pode questionar a dimensão do projecto, se nele incluirmos toda a nova zona urbana que se pretende vir a acompanhar a zona circundante do estádio, face às evidentes repercussões que se poderão
fazer sentir no meio ambiente. A natureza e as condições de operação somente me parecem relevantes e questionáveis se concetenadas com o a questão da localização.
Do meu ponto de vista, parece-me mesmo que o aspecto essencial é mesmo a localização, ou seja, se esta seria a única localização viável para um projecto desta envergadura. É bastante discutível se a localização do estádio dentro uma Reserva Nacional será minimamente adequada. A potencial degradação daquele meio ambiente é bastante elevada, vindo certamente a ter repercussões na fauna e na flora que habitam tal área, leva-me a crer que esta não terá sido a melhor solução, acrescentando o argumento que
haveria certamente outras áreas susceptíveis de acolher este projecto, sendo certo que não seria benéfico para o mesmo, se a construção do estádio tivesse lugar num local demasiadamento afastdo da cidade de Setúbal, onde vive a grande maioria de adeptos do VFC. Mas o mesmo problema que se levantou em relação à línea c), é também relevante em termos da aplicação desta alínea b), uma vez que cabe aos ministros responsáveis delimitar a necessidade de AIA, baseando-se no critério dos efeitos significativos do projecto na área protegida.
Em relação às ONGA's e ao papel que assumiram neste procedimento, cabe destacar a QUERCUS, uma vez que foi a única organização deste género a tomar efectivas medidas com vista a evitar a degradação da RNES. Nos termos dos arts. 1º/1 e 2, e 2º dos respectivos estatutos, publicados em Diário da República, a QUERCUS é uma ONGA, para efeitos do referido no art. 2º/1, da LONGA. Nesse contexto são lhe conferidos amplos poderes de protecção ambiental, nomeadamente o reurso às vias judicial e administrativa, quando esteja em causa a conservação do meio ambiental. E assim, a QUERCUS avançou com uma providência cautelar no TAC de Lsiboa, no sentido de evitar o abatimento de cerca de 8000 sobreiros, equanto consequência do acto licenciamento tendente à aprovação da construção do referido complexo desportivo. O TCA de Lisboa indiferiu a providência cautelar, adoptando claramente uma postura que se afigura bastante protectora do ambiente, até porque não se tratava de efectivar a protecção exigida por lei a uma área protegida de interesse nacional!
Perante tudo quanto ficou dito, e também pelo que foi feito pela QUERCUS, restaria somente uma via possível, com vista a resolver todo este caso. Essa via seria a de procurar a Responsabilidade Civil por Dano Ambiental, nos termos do DL nº 147/2008, de acordo com o que ficou dito sobre esse tema no ponto 6. Assim, estaria ao dipor da população interessada, nomeadamente os meios de carácter preventivo, uma vez que o dano ainda não se produziu. Para todos os aspectos deste regime remete-se para o que ficou dito nesse mencionado ponto 6.

8. CONCLUSÃO

Com o presente trabalho procurou-se esclarecer um caso que levantou polémica nos meios de comunicação social, tendo mesmo chegado à via judicial, embora com os resultados que se conhecem. Muito embora o alcance pretendido não tenha sido alcançado, por falta de meios que ajudassem à recolha de mais informações relevantes, bem como pela falta de colaboração da parte da organização que poderia dar um contributo deveras importante para que se esmiuçasse com maior pormenor tudo aquilo que ficou por tratar.
Percorrendo um caminho montanhoso e de evolução bastante lenta, a legislação e prática ambientais seguem o seu caminho naquele que é um ramo do Direito ainda recente e com muita margem de progressão para o futuro, verificou-se que existem ainda muitos mistérios por desvendar no que toca ao respeito pelo meio ambiente e ao reconhecimento de que se trata de um aspecto fundamental da convivência e saúde em sociedade. Se, por um lado, é verdade que deve ser atribuída a maior importância ao desenvolvimento económico, bem como à livre iniciativa económinca dos particuares, nomeadamente num momento tão sensível e preocupante como é o da crise mundial, da qual Portugal não se pode (nem consegue) alhear, devendo por isso ser incentivadas actuações que permitam dar mais saúde económica e ocupação às empresas nacionais, por outro lado, e como já ficou referido anteriormente, esse desenvolvimento deve ser sustentável e conjugado com a necessidade, também ela imperiosa, de assegurar uma efectiva protecção do meio ambiental, sem a qual a qualidade da vivência humana não poderá evoluir no sentido correcto. Exemplos há (e são de sobra) de que o desrespeito pelo meio ambiente pode ter as mais graves consequências, muitas vezes até, sem retorno. E se nós, europeus, na qualidade de sociedade mais evoluída do mundo actual, fomos os primeiros a dar o exemplo, poderemos inspirar, não só os povos mais atrasados no seu desenvolvimento, como igualmente as gerações vindouras, para o futuro seja mais verde, o céu menos negro e o ar menos pesado.
Têm sido várias as situações susceptíveis de gerar danos ambientais e ecológicos nos nosso país. E a nossa legislação tem, nos últimos vinte anos, passado por um processo evolutivo bastante interessante, que cada vez mais vem assegurando mecanismos coerentes de protecção ambiental. O contributo comunitário, neste aspacto como em tantos outros, tem desempenhado um papel fulcral em tal desenvolvimento. Mas o trabalho está inacabado. Agora chegou o momento de coadunar a evolução legislativa (pese embora as críticas de que pode ser alvo, e de que sempre será), com uma evolução na aplicação prática dessas mesmas normas, pois parece que reside aí o principal problema nos dias que correm. E se, neste aspecto, se levanta o véu sobre um grande problema da sociedade actual (o da corrupção e das manobras de influência junto dos poderes constituídos), é porque, de facto, tal problema assume um relevo central no tratamento de temas como os da AIA, quando não seja obrigatória por lei, o dos licenciamentos obscuros ou o da falta de fundamentação das escolhas com elevado grau de discricionaridade. E tais temas são o núcleo de um trabalho cujo tema passa precisamente por tais áreas.
Esperemos ter dado um contributo interessante para o tema escolhido, julgando haver grande margem de manobra para continuar a questionar opções como aquela que visou o presente estudo, com a peefeita noção de que muito ficou por dizer.

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